GAÚCHO NEGRO, O JUSTICEIRO BRASILEIRO
Mascarado conta como é ser um herói da vida real
Pessoal, quero falar de um movimento muito maneiro que há tempos venho estudando. Trata-se do Real Life Super Heroes (Super Heróis da Vida Real, em tradução livre).
O RLSH é um projeto internacional de ajuda comunitária, baseada nos conceitos e na figura do super herói de quadrinhos. Basicamente, os membros do movimento tomam um caminho mais prático e, claramente, mais chamativopara lidar com problemas urbanos da atualidade, como violência, marginalização, estupro e miséria. Geralmente vestidos com fantasias heróicas, alguns ajudam os necessitados por movimentos sociais locais. Doam roupas, distribuem comida e visitam escolas. Já outros partem para patrulhas e ajudam a defender a população! Inclusive, usam até protocolos de atuação e treinamento marcial!
O movimento se tornou muito popular. Pessoas comuns de todo o planeta que não sabiam como fazer a diferença encontraram no RLSH seu ponto de inspiração. Com um objetivo muito claro em mente, essas pessoas incentivam o auto-aperfeiçoamento físico e moral, a reflexão em sociedade e a promoção do bem comum a partir da imagem icônica do herói. Do velho herói. Da capacidade humana de ser super e de se expressar em defesa do que é justo.
Bem que podíamos ter pessoas assim no Brasil, não acha? Mas espera. Nós temos sim. Além do Ciclista Prateado, daSuper Super Dara e vários outros, há também um justiceiro que atua nos frios becos do sul do país, a misteriosa figura de Gaúcho Negro.
E o Velho Herói teve a oportunidade de conversar com o próprio justiceiro sulista. O cara é profissional da área de segurança, pai e ativista social. Ele nos explica um pouco sobre como decidiu ser um super herói da vida real, seus métodos de atuação e os resultados do movimento, além de dar um ou dois conselhos para quem quer ser um RLSH. Você acha que conseguiria? Então vamos lá.
Velho Herói: Qual seu peso, altura e idade? Imagino que você não possa dizer seu nome verdadeiro, certo?
Não posso dizer para o publico, mas a policia e os organizadores dos eventos sabem quem sou eu. Tenho hoje 98 kg, 1,70 cm de altura, 43 anos. Quando eu comecei, pesava uns 130 kg. Comecei a malhar, fiz reeducação alimentar, emagreci e ganhei músculos. Mais pela saúde do que pelo projeto.
Velho Herói: Onde você atua?
Atuo na Redenção, em Cachoeirinha e Gravataí, em Porto Alegre. As pessoas só me avistam nos deslocamentos, onde escolho um lugar e fico ali, no escuro, só observando… como estou todo de preto, ninguém me vê.
Velho Herói: E como tudo começou? Você teve inspiração em algum quadrinho ou foi direto no movimentos dos RLSHs?
Estou envolvido com causas sociais desde jovem. Tomei conhecimento do movimento RLSH pelo portal Omelete, que fez uma matéria sobre o projeto de Peter Tungen, fotógrafo de vários filmes de heróis, e achei que seria bem interessante para passar bons valores para as crianças e adolescentes. Principalmente aos fãs de HQs e filmes de heróis.
Velho Herói: Conhecemos o movimento dos RLSH, mas você poderia descrevê-lo em suas palavras? Acho que muita gente ainda pensa num monte de caras que se vestem de roupas coloridas e saem por aí. Claro que não se trata disso, não é?
Eu resumiria da seguinte maneira: ação social com fantasias. Nessa mesma definição ponho os Doutores da Alegria, só que o raio de ação RLSH é mais amplo. Algumas pessoas acham que ser RLSH é vestir uma fantasia e bancar uma de herói de quadrinhos, sair procurando confusão, mas isso não é verdade. Ser um RLSH é estar disponível e pronto para ajudar quem precise.
Velho Herói: Como isso funciona exatamente? Você faz rondas todas as noites sempre no mesmo local? Como você age e quais são seus objetivos?
Faço rondas. E conforme a minha escala no trabalho me permite. Mudo os locais, mas escolho aqueles com maior periculosidade para pessoas mais vulneráveis, como idosos, crianças, adolescentes e mulheres. Meu objetivo é ajudar quem precisa e fazer o que está ao meu alcance.
Velho Herói: Você possui treinamento em artes marciais e em primeiros socorros? Já precisou usar algum conhecimento desses numa ronda? Conte-nos como foi.
Sei defesa pessoal e fui da brigada de incêndio numa empresa em que trabalhei. Quando não sei realizar algum socorro, chamo imediatamente os profissionais e os aguardo. A vez mais notória ocorreu em Cachoeirinha. Flagrei um acidente de trânsito com uma moto. Socorri o motociclista, orientei-o a não se mover e interrompi aquela parte do transito, sinalizando o acidente. Essa história está até na #01 do meu gibi. As pessoas passavam de carros ou ônibus e viam toda a ação, no horário de pico. Logo em seguida chamei a SAMU e auxiliei os paramédicos na remoção do acidentado.
Velho Herói: Como se compõe seu treino e dieta? Que exercícios você faz, como você cuida de si para aguentar as rondas?
Musculação e bastante exercício aeróbico. Tento dormir bem e descansar nos intervalos do meu trabalho. Eu trabalho 12 horas diárias.
Velho Herói: Sua identidade como Gaúcho Negro já causou problemas com a família, amigos ou com a polícia local?
Não. Pelo contrário, meus filhos adoram! A minha mãe tem medo, mas ela é mãe. E a policia me conhece pela identidade civil. Eles sabem que sou um colaborador e cidadão de bem.
Velho Herói: O Batman usa o medo tanto de forma literal quanto metafórica. E você, tem ou usa do medo? E esse medo, se existir, é positivo ou atrapalha? Por quê?
Sim, eu me uso do medo… já impedi uma tentativa de abuso sexual sem sequer usar de violência física. O agressor simplesmente se assustou. Assusto as pessoas até sem querer, pois sou muito silencioso para me deslocar, e as pessoas ficam com medo de topar com alguém de mascara e todo de preto na madrugada. É positivo quando acontece com o meliante que, normalmente, está alterado por drogas, mas é ruim quando a pessoa defendida fica com medo. Tenho um porte forte, e quem é abordado por mim fica receoso.
Velho Herói: Nas suas rondas você encontrou pessoas interessantes, tenho certeza. Pode nos dar exemplos? Digo: como Gaúcho Negro, você conheceu alguém em especial de quem sempre se lembra? Alguém com uma história marcante?
Teve um cara, não sei nem seu nome. Ele estava em coma alcoólico, jogado na rua. Chamei a SAMU e acompanhei os primeiros procedimentos. Ele sequer tinha documentos! O pessoal da SAMU comentou que, se não o tivessem socorrido, ele poderia ter morrido na rua mesmo.
Velho Herói: Talvez fosse melhor ter começado por aí, mas por que o nome “Gaúcho Negro”?
Assim que defini o que eu queria fazer, comecei a pensar num nome, uniforme etc. Decidi que me vestiria de preto, da cabeça aos pés, pois minha intenção sempre foi a de não ser visto nas patrulhas, mas sim poder observar a tudo e a todos. Como os lugares que escolhi para patrulhar são todos meio desertos e de pouca luminosidade, fiz isso pensando em pessoas que esperam ônibus ou circulam vindo do trabalho, sendo alvos fáceis. Agora, “Gaúcho” é porque minha ação se limita ao meu Estado – ou a uma parte dele. É também para associar à ideia de que homens vigiem e intervenham em situações de risco. E esse tipo “justiceiro” é muito forte na cultura do gaúcho. Por fim, coloquei “RLSH” para identificar o movimento e não ser confundido com aquele zorro paraguaio do filme da Xuxa.
Velho Herói: Você deve ter se tornado uma figura conhecida na sua região! Sei que você participou de eventos e programas educativos. Conte-nos mais sobre essas experiências com as crianças e como as pessoas de sua região enxergam o que você faz. Elas se sentem mais seguras?
Me tornei conhecido. Só que localmente e nos meios educacionais. Quem me conheceu mesmo ou foi pela Internet ou foi abordado nas patrulhas. Este ano pretendo fazer algumas aparições públicas para arrecadar donativos. Mas nas patrulhas, quanto menos eu for visto, melhor. Quanto às pessoas se sentirem mais seguras eu acredito que isso não ocorre. Até porque a minha função não é combater o crime com ação policial e sim colaborar com investigações e ações de salvamento.
Velho Herói: Algum conselho para alguém que esteja pensando em ser um RLSH no Brasil? Algo que você não sabia quando começou.
Olha, antes de começar, entrei em contato com os RLSH’s dos EUA e li (e reli) todas as diretrizes que estão no site superheroeregistry.org. Não comecei do zero mesmo. Dezenas de “rlsh’s” brasileiros me procuraram e já sumiram. Todos eles eram cheios de entusiasmo juvenil e nenhuma base ou treinamento. Só que a função do RLSH, antes de tudo, é inspirar a fazer o bem. Então o conselho que posso dar é o seguinte: tenha certeza do que quer fazer pelo porquê do que quer fazer. Antes de começar a agir, estude por vários meses onde e como atuar. Daí sim, mãos a obra. De preferência, em dupla. É isso aí.
Além de ser vigilante e justiceiro, o Gaúcho Negro também possui um gibi oficial direcionado a crianças de 2 a 8 anos. O projeto educacional em quadrinhos foi realizado em parceria com o desenhista e amigo Rogério de Souza. Para saber mais sobre o Gaúcho Negro e sua iniciativa em Porto Alegre e no brasil, acesse o blog do justiceiro aqui ou envie uma mensagem pelo Orkut do herói.
Quer se tornar um super herói da vida real? Bom, não deixe de ler as diretrizes no site oficial do movimento e saber como funciona. Para maiores informações, envie um email para info@reallifesuperheroes.com.
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